quarta-feira, 17 de julho de 2013

É condensar o mundo num só grito

Kate Bosworth
Escrevi-lhe muitas cartas, muitas cartas lhe escrevi. Nunca as enviei para lado nenhum, nunca ninguém as leu e o mais provável é que fiquem esquecidas no fundo da caixa onde guardo os meus segredos. Há-de chegar o momento em que me esvazie, olhos nos olhos. Preciso de dizer tudo, sempre precisei. Com o passar dos anos, vou tendo confirmada a certeza de que sou mesmo uma mulher de comunicação.
Preciso de expelir sentimentos, de falar para pensar e para me entender ou perceber o mundo. Falando, articulo raciocínios e não me perco por entre a leveza do pensamento, que se dispersa sem que me aperceba.
Preciso de escrever para me verter quando não posso falar. Há vezes em que não me apetece, alturas em que não posso, oportunidades que não se criam. E então escrevo, unindo por frases as palavras, por palavras as ideias, por ideias as razões, por razões os tantos sentimentos - medos, angústias, ambições.
Essa necessidade minha é tão premente que passou a ser paixão. É um gosto escrever, a escrita é um prazer. Foram poemas na adolescência - ou aglomerados de orações curtas que não alcançavam a margem direita das folhas de papel - e muita prosa poética no início dos vintes. Agora estou sem registo definido, que o jornalismo acabou por me ensinar a sintetizar estórias sem romance nem recursos estilísticos e quando dou por mim a escrever o que me apetece, ou seja, textos que não se insiram na categoria dos artigos ou das reportagens, sofro demasiado. É que quem escreve, vive duas vezes: uma quando atravessa a situação e outra, enquanto sucumbe à recordação e a imprime nas letras. Choro a escrever, mas não vivo sem o fazer. Talvez seja uma fase, talvez seja o meu fardo, o meu fado. Não sei. É quase um masoquismo, uma busca pela catarse que não é possível experienciar de outra forma. Há um quê de melancolia e de saudade neste processo singular, mas tão viciante que não penso deixá-lo. Talvez por isso tenha estranhado tanto a frase que li, de Eugénio de Andrade, através do facebook daquela que foi e será para sempre A Minha Professora de Português: «Eu nem sequer gosto de escrever. Acontece-me às vezes estar tão desesperado que me refugio no papel como quem se esconde para chorar. E o mais estranho é arrancar da minha angústia palavras de profunda reconciliação com a vida». Caso cortássemos a parte que diz «nem sequer», esta afirmação poderia ser minha. Porque escreverei até que o reumatismo e as artroses me doam.

2 comentários:

Ana Catarina disse...

E ainda bem que te consegues exprimir tão bem pela escrita! :)

Lady Lamp disse...

Obrigada, querida*