quinta-feira, 18 de outubro de 2012

sobre os temas que não revisito.

Marisa Miller
Claro que dói. Dói muito. Dói tão intensamente cá dentro que chego a sentir a pele doer. Acho que às tantas, as dores se fundem e já não sabemos se é a alma ou o corpo que sofre com o que o coração nos leva a sentir. Claro que também tenho noites em que em vez do pacífico sono sou atormentada por insónias angustiantes. Sabes, dessas noites, o único vestígio que deixo é a almofada manchada de sal, que a cosmética faz maravilhas pelos olhos inchados e pela pele assada pelo pranto. Não te falo dessas dores porque não quero revivê-las. Deixei de escrever sobre elas porque o escritor tem uma sina de mártir: vive duas vezes. Uma quando habita o momento fisicamente e outra quando escreve sobre ele, num processo que tem tanto de catarse como de masoquismo. Deixei de escrever sobre elas, sobre essas dores, porque não quero voltar a lugares escuros. Talvez tenha perdido qualquer coisa, que o sofrimento traz inspiração e uma febril sede de deixar fluir através da tinta da esferográfica o que não sabemos vociferar. É que para nós, que preferimos a escrita a qualquer outra forma de comunicação, falar é difícil. A espontaneidade rouba-nos o fio condutor, leva-nos por caminhos que não controlamos. Enquanto escrevemos, não perdemos o fio condutor e encontramos o tom ou o termo perfeito para expressar o que a voz cala. Talvez tenha perdido qualquer coisa, mas ganhei outra: já não sofro a dobrar. Agora tem que ser assim, percebes? Quando me sentir forte, firme e gigante outra vez, talvez torne a falar das minhas dores nas páginas em branco que preencho.

3 comentários:

Flow disse...

É bem verdade... adorei as palavras :)

Carlos Soares disse...

mas é o reviver que liberta...transforma a dor em algo mais bonito...

carolaine disse...

temos escritora. lindo e sentido !

http://tarasneurasmanias.blogspot.pt/