segunda-feira, 27 de setembro de 2010

traídas

Kate Winslet
Não confio em ninguém. Ou melhor, não há ninguém em quem confie plenamente. A 100 por cento. Não consigo, traumas antigos, marcas profundas, que o que nos aflige na infância pode tornar-se num medo irracional quando adultos. A vida é feita de consequências e nem tudo se transforma como gostaríamos. Não confio. Tenho tendência a admirar a patetice de quem o faz. Não compreendo, porque considero irracional e pertencente ao campo da fé, quem põe as mãos no fogo por alguém. Mesmo com as habituais balelas, mesmo que o outro não tenha cadastro, mesmo que tudo seja lindo quando existe essa confiança burra. "Se ele está comigo é porque gosta de mim, se não quisesse estar, dizia-me, para poder ficar com quem queira", dizem algumas pessoas que conheço em relação aos namorados. Levam a sério o livre-arbítrio, essa liberdade de escolha inata. Acreditam piamente que, no caso de surgir um novo interesse, o ser amado seria íntegro o suficiente para partilhar a verdade e seguir o seu caminho, tudo com base num respeito utópico. Não compreendo essa visão, nunca compreendi. E ainda que compreenda, não a assimilei. Não ponho em prática, parece-me naïf. Demasiado ingénuo para o meu cinismo. Daria a mão à palmatória se existisse um único caso em que essa confiança, esse laço elevado e evoluído, desse provas de compensar. Nunca dá. Não vale a pena. Mais cedo ou mais tarde, a medíocre natureza humana dá pistas de que num plano terreno, mais vale ter um olho no burro e outro no cigano. A facada vem quando baixamos a guarda. E há duas hipóteses, depois de avaliar a vastidão do sentimento que nos unia a quem nos desiludiu: continuar de mãos dadas, nunca esquecendo o sucedido, mas tentando superar... (e trazendo o assunto à baila em cada discussão durante muitos e muitos anos) ou desistir, porque as relações exigem muito trabalho.
Tenho para com as mulheres traídas uma solidariedade comovida, uma dor sentida e um abraço sincero. São poucas as que conheço que nunca passaram por esse pântano. É uma angústia imensa, uma avassaladora sensação de perda de controlo, é ficar sem chão e sem tecto. É um susto, um pânico. Depois uma raiva, um nojo.
Mas vale sempre a pena relembrar que o tempo passa. O que hoje é uma ferida aberta e sangrenta, dentro de um mês será uma cicatriz em cura. Tudo parece pior no momento, mas há sempre momentos depois desse. E sim, é mesmo verdade que o tempo ajuda. E eu, no que puder, também.

1 comentário:

Anónimo disse...

Antes de mais quero dar-te os parabéns pela forma como usas as palavras!

Quanto a este post, é incrível aquilo em que as pessoas nos podem fazer acreditar, que foi apenas um momento de fraqueza e que nada significou! Mas com certeza que no momento o/a companheiro/a não veio ao pensamento! Quando alguém trai, não se trata de um momento de "fraqueza" fisica, são na verdade problemas muito mais sérios que é mais fácil varre-los para baixo do tapete do que enfrenta-los! infelizmente é assim...