sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

aspectos práticos que me fazem espécie

Penélope Cruz
Já aqui dei a minha opinião quanto a voltar a tentar. Acredito em reencontros quando são movidos por amor, que o romantismo faz parte de mim e a fé dá-me esta capacidade quase ingénua de acreditar em milagres - sem ironias. 

Em contrapartida, na maioria dos casos sou uma descrente. Se não vejo amor, sou a primeira a ver cobardia em quem decide não abandonar a sua zona de conforto fazendo uso de desculpas. Há várias, tantas como os casos de não-amor que existem. 

Há os namorados que até vivem juntos porque ela mantém a casa limpa e arrumada. 
Os casais que não querem desapontar a família ou os amigos, que ficariam com as férias de Verão arruinadas. 
Há aqueles que não querem abrir mão da companhia para marcar presença nos casamentos dos amigos. 
Outros que apontam os filhos como razão para ultrapassar diferenças outrora impossíveis de colmatar, como se a harmonia se pudesse forçar e como se fosse possível disfarçar a ausência de paz, compreensão, amor e devoção no seio do casal. Às vezes pergunto-me se a infância destes últimos terá sido assim tão mais longínqua que a minha, já que consigo recordar-me com frescura da forma como sentia, ainda que não compreendesse tudo o que me rodeava. As crianças podem até nem perceber racional e intelectualmente o seu contexto mas absorvem-no através do sentir e distinguem o real do que é falso, o bom do que é nocivo, o saudável do que é tóxico. Não há ambiente favorável ao crescimento de uma criança quando a família é apenas fachada. 
Conheço fulanos que afirmam ter na namorada uma simples amiga e que se envolvem com muitas outras pessoas fora da relação, sem consentimento ou conhecimento da outra parte, preferindo essa vida pobre à liberdade de poder encontrar lá fora algo que os preencha verdadeiramente. 
Conheço mulheres cheias de potencial para arriscar sair de relações insatisfatórias e assumir um papel poderoso nas suas vidas mas que passam os dias com medo e culpa. Sabem que são subestimadas, que não são tratadas como merecem e ficam ali. 

Não entendo.
Mas há outra coisa que não entendo.
Um aspecto prático e aparentemente pequeno mas que me faz espécie.

Como é que se volta para os braços de alguém com quem estivemos no passado, depois de um longo período de tempo em que cada um esteve com quem quis, sem precisar de mudar a cama e o colchão? Como assim? Não há nem uma pontinha de nojo por voltar ao quarto onde já esteve outra mulher? Não há asco por voltar a um espaço que entretanto já foi o cenário de outra pessoa? Houve outro alguém a dormir ali e isso não faz mal? O que é isso? Amor? Que sentimento é esse? Eu não sei amar sem ciúme nem posse e talvez o defeito seja meu, daí a dúvida. 
Sei que se voltasse para um ex meu (Deus me livre), não quereria partilhar com ele um lugar que tivesse sido dele e de outra mulher. Não seria capaz de superar o facto de ele ter corrompido aquele que tinha sido o nosso lar. Não ia aguentar o ardor no peito por me lembrar de cada vez que outra mulher poderia ter-se deitado na nossa cama, usado a nossa casa-de-banho, tomado o pequeno-almoço na nossa cozinha. Até o sofá seria objecto de ódio, já que de certeza que teriam estado juntos e abraçados ali, a ver qualquer coisa na televisão ou a beber um copo de vinho perante a lareira acesa. Teria ela usado o roupão dele? Terá sido uma amante perfeita, daquelas que o acordam com um pequeno-almoço maravilhoso? 

Não sei, penso nestas coisas menores quando me contam histórias que me impressionam.

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