quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

É hoje.

Mais um Natal. Mais uma noite de consoada. Antes era assim. Espero que a magia volte quando tiver os meus filhos. Agora somos todos crescidos, não é a mesma coisa e continuo a sentir imensa dificuldade em contornar aquela nostalgia que se apodera de mim nesta época. Fico melancólica, tristonha, com as lágrimas a quererem nascer por tudo e por nada. Tenho saudades dos mortos e dos vivos, saudades do que ainda não vivi, saudades de quando era feliz e não sabia. E sinto-me sempre péssima por não conseguir mudar o mundo. Por não poder oferecer um Natal quentinho e saboroso como o meu a quem não tem nada nem ninguém. Por não poder evitar que haja quem passe esta noite ao frio, de alma gelada. É com todos esses que o meu coração está, no fundo. Porque me dói o ano inteiro, mas nesta noite, pelo menos nesta noite, era suposto que as pessoas não sofressem. Era suposto que não me sentisse mal por ser uma privilegiada. Era suposto. 
- Pai, pelo menos nesta noite os meninos que vivem em países de guerra podem dormir descansados? - perguntava, todas as consoadas, a cara molhada de tanto choro.
- Sim, Ana. Os presidentes dos países em guerra não permitem que nesta noite haja qualquer tipo de guerra.
- Como é que sabes, pai?
- Sei. Eles dizem sempre na televisão, é obrigatório para o mundo todo.
- Mesmo para os que não acreditam em Jesus?
- Mesmo para esses. É uma regra mundial.
- E os meninos que vivem nas ruas, pai? Estão ao frio? Não comem?
- Nesta noite, há voluntários que lhes servem uma ceia e que lhes dão um sítio para que possam dormir.
- E porque é que não fazem isso sempre, pai?
- Porque não têm dinheiro para isso.
- E os animais abandonados, pai? Passam o Natal sozinhos, na rua, à chuva?
- Não, também têm voluntários que os colocam em caixotinhos quentinhos com mantas.
E só assim comia descansada. Há coisas que nunca mudam. O pior é que quando crescemos, não há petas que nos sosseguem.
Gostava que o pai dos meus filhos concordasse comigo e não colocasse obstáculos à forma como gostaria de passar a noite de 24 de Dezembro: a servir ceias a pessoas sem família, sem saúde financeira, sem esperança. O dia 25 poderia ser tudo o que tradicionalmente já é, mas que a noite fosse de dádiva, porque não vejo forma mais Cristã de comemorar o aniversário de Jesus.
Feliz Natal.

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