terça-feira, 19 de junho de 2018

O que a Antónia diz da Ana diz mais sobre a Antónia do que sobre a Ana.

É tão fácil, parece óbvio, no entanto a maioria das pessoas parece não compreender tanta simplicidade. Talvez seja eu um génio, vá-se lá saber. É que para mim é básico. 

Noto uma dificuldade imensa em mudar de prisma, ver o mesmo caso de outro ângulo. Como se as pessoas não conseguissem colocar-se na pele do outro. Como se lhes fosse impossível encaixar outro ponto de vista. Perceber outra perspectiva. Uma falta de empatia imensa, um egocentrismo desmedido e o resultado? Toneladas de mal-entendidos, relações enfraquecidas e gastas por mera falta de compreensão. 

Acredito que quem estima resolve questões menores para que elas não se acumulem. Acredito também que quando gostamos de alguém, gostamos além dos defeitos, que aceitamos como parte do todo que o outro representa. Sei que quando amamos, além de respeitar o outro, prezamos a relação, tomamos conta dela, cuidamos para que não se estrague. Em suma, gosto muito de gente que fala quando algo incomoda. É prova de amor, de zelo, de respeito e de altruísmo, pois criamos a oportunidade perfeita para que o outro se explique e se desculpe se disso for caso.

Gosto de gente que abre o jogo, põe as cartas na mesa e se revela, dando espaço a que do outro lado, seja possível fazer o mesmo. Gosto de gente que não se perde em mimimis, como aqueles que preferem queixar-se a um terceiro em vez de ir imediatamente à raiz do problema. Se a minha relação com a Joana é entre mim e a Joana, os meus atritos com a Joana são meus e da Joana, não há cá falatórios com mais ninguém. É por isso que os resolvo com ela. E não, não estou chateada com nenhuma das minhas amadas Joanas.

Este tipo de tricas causa-me repulsa e tendo a afastar-me porque não vou baixar as minhas vibrações só porque alguém decidiu não elevar as suas. Além disso, não tenho tempo nem paciência para o desgaste que elas me causam - é como se me sugassem energia.

Quando era miúda, achava que a maturidade era algo que ia aumentando em cada ser à medida que o crescimento ia acontecendo. Hoje, do alto dos meus joviais 32 anos, percebo que não. Conheço pessoas com 50 anos tão maduras do ponto de vista emocional como eu era aos 17. Ainda não percebi como é que isso se processa mas não deixo de me surpreender com a imaturidade de pessoas que já tiveram vivências suficientemente intensas para se virem a tornar em adultos na verdadeira acepção do termo.

Só a falta de maturidade nos faz esquecer anos de convivência e de amizade sincera para acreditar na má fé de atitudes vindas de alguém que conhecemos bem antes de lhe dar espaço para expor os seus argumentos e os seus motivos. É nesses momentos que quem realmente somos vem ao de cima - assumimos que o outro está a ser mesquinho porque o somos; assumimos que o outro está a ser movido por maldade porque somos maus; assumimos que o outro age por negligência porque somos negligentes. Quem é bom, não espera maldade gratuita dos outros. Quem é justo, acredita na inocência do seu amigo até ter provas em contrário. Mais uma vez, simples.

E então vejo-os ali, de olhos postos no seu próprio umbigo, sem se aperceberem de que o outro, aquele que julgam e de quem se queixam com prontidão e convicção, também tem uma versão da história que contam. Talvez seja defeito de formação, que o Jornalismo vive em quem o tem como vocação: nunca me esqueço de que a verdade costuma estar no meio de dois ou mais relatos. Também não me esqueço de que ao apontar o dedo na direcção de alguém, tenho três virados para mim mesma.

- Ela não me diz nada, não me telefona nem envia uma mensagem.
Eu também recebo chamadas. Quando não atendo, retribuo assim que posso. Comigo, não há mensagens que fiquem por responder. Não é impossível falarmos se as saudades realmente apertarem.

- Ela não me visita.
Talvez não tenha recebido convite algum, talvez não goste de aparecer de surpresa porque sei que toda a gente tem os seus dias ocupados ou talvez não me sinta bem-vinda - evito sempre lugares onde não sou bem-vinda. Manias.

- Ela não me conta nada da vida dela.
Talvez seja mais simples perguntar exactamente o que se quer saber. Não sou muito apologista de falar acerca da minha vida de forma espontânea. Primeiro, por preguiça. Segundo, porque nem sempre tenho coisas para contar, apesar de saber que a minha vida é super interessante para a maioria das pessoas (mais do que para mim mesma). Por achar indelicado focar todas as atenções em mim, acabo por sentir que não há razão para ocupar tempo com um monólogo sobre a minha última semana. Não me acho assim tanto. Também posso crer que do outro lado não há assim tanta genuína vontade de saber de tudo o que se passa comigo, já que não há qualquer questão colocada sobre o assunto. Curioso é quando descubro que não me perguntam pessoalmente sobre o meu mais recente projecto mas não se coíbem de perguntar a algum amigo comum. Estranho, não?

- Ela não me deu a atenção de que eu precisava.
Tudo o que faço tem um motivo. Não sou tresloucada, mesmo que alguma reacção minha pareça exagerada num determinado momento. Talvez esteja simplesmente a reagir a alguma coisa. As relações são feitas de reciprocidade. Por exemplo, se desvalorizar uma dor no teu mindinho, talvez seja porque me mandaste secar as lágrimas quando me abriram o peito a sangue frio. Se não faço um festão no teu aniversário, talvez seja porque fizeste questão de me magoar no meu. Se não quero saber da tua dor de dentes, talvez seja porque te riste quando te contei acerca das minhas crises de ansiedade. Se não te sentes importante na minha vida, talvez seja porque deixei de me sentir importante na tua. Tudo claro, comigo. Tudo simples.

- Ela passou por mim e nem me cumprimentou.
Antes de mais nada, sou míope e extremamente distraída. Mas se me viram, porque não vieram falar? Tenho que andar a prestar reverência a toda a gente? Somos todos Rainha de Inglaterra, queres ver?

- Ela não me procura nem me convida para fazermos qualquer coisa.
E tu? Procuras-me e convidas-me para fazermos qualquer coisa? Ou será que deixei de procurar porque me fartei de levar tampas? 

- Já não quer saber da família.
O conceito de família é como o da amizade: varia de pessoa para pessoa. Depois de ser tratada como familiar de segunda, não esperem muitas e calorosas manifestações de amor da minha parte. Não faço de propósito, esmorece-se qualquer coisa cá dentro que não me deixa ser mais.

- Ela está mais fria, parece estar sempre na defensiva.
Não. Só selecciono melhor aqueles para quem canalizo o melhor de mim.

Farta de gente parva.
Começo a achar que tem razão quem me disse que ser tanta luz incomodava demasiado. 
Uma pessoa não pode existir em paz.

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