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sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Tudo perfeito na sua imperfeição.

Tudo perfeito na sua imperfeição. Bonito, mas não em demasia. Mais másculo que boneco, como ela preferia. Sorriso lindo, daqueles que congelam o mundo à volta. Mãos perfeitas, voz grave, cabelo denso. Como se Deus tivesse materializado a wishlist dela. Vocês estão a ver o tipo: pernas grossas, ombros largos, um pescoço forte. Um homem. Um homem moreno, grande mas mimento. Inteligente e divertido. Livre, tão livre que surpreende. Um homem que a fazia sentir-se mulher. Dançou com ela na rua, num parque de estacionamento, sem música. Riam-se juntos. E pouco depois, ele puxava-a para si. Ela afastava-se, centímetros entre eles, ele puxava-a para si novamente. Ela demorou a dar-se, tantos medos. Ele não fez nada de especial, foi tudo tão inusitado e dizem que quando não esperamos, a Vida nos surpreende. Ela achou que aquela tinha sido uma boa surpresa que a Vida lhe trouxera. Acreditou piamente nisso. Já não queria nada, já não acreditava em nada, ele apareceu. Foi ele que apareceu. Sem saber porquê, deixou-se levar. Conversavam imenso, baboseiras ou temas sérios, despudorados. Pareciam ter tanto em comum e ele fazia-a sentir-se capaz de fazer tudo. Era uma menina, com ele. Ao contrário do que fazia sempre, despiu as roupas de mulher adulta e segura para se mostrar tal como era. Deu-se. Sem perder tempo com jogos. É que ao lado dele, era tudo leve e o resto não interessava. Encantou-se e eu até consigo precisar em que fracção de segundo, em que ínfimo espaço temporal tudo mudou. Foi ali. Estava sentada. Perna traçada. Tinham acabado de ver o pôr-do-sol mais marcante do Verão dela, sentados na areia, em frente ao mar. Ele não sabia, mas ela já estava envolvida quando a abraçou e a fez sentir-se protegida. Uma menina. O caminho de regresso à realidade, depois de se encontrarem, era sempre tão sereno. Tanta paz. Nunca lhe tinha acontecido. Era sempre absorvida por uma extrema excitação quando vivia um novo romance. Havia sempre um acelerar do coração. Não desta vez. Desta vez era enorme a paz que a envolvia. Era suave o sorriso. Era simples. E quando deu por ela, por causa de tudo o que estavam a ser e de como era tudo diferente, já tinha expectativas. Já queria mimá-lo. Já queria. Já sonhava. Sonhou ser a cúmplice, mostrar-lhe que com ela era tudo melhor. Ele tinha o estigma da ovelha negra, ela faria com que sentisse que pertencia ali, junto dela. Que podiam ser os dois estranhos e criar um mundo onde ela seria o sol que lhe iluminaria aquele lado lunar tão acentuado. Seriam cúmplices. Ela já sonhava.

E quando deu por ela, era tudo mentira.

Provavelmente, nunca saberá o que realmente aconteceu. Ele foi-se embora e ela até chorou. Sentiu falta dele. Do sorriso lindo, daqueles que congelam o mundo à volta. Das mãos perfeitas, da voz grave, do cabelo denso que acariciou enquanto o viu adormecer. Sentiu saudades das conversas, do abraço, do beijo. De lhe tocar. Do cheiro dele. De tudo o que tinha imaginado e que ainda não tinha concretizado. Como nestas coisas do coração sempre foi de oito ou oitenta, de tudo ou nada, de ter ou não ter, de sim ou sopas, não se contentou com migalhas. Não conseguiu ir contra a sua natureza. Não quis ser mais uma amiga daquelas que se procuram quando apetece. Ama-se tanto, ama-se mais do que a qualquer outra pessoa, ama-se profundamente. E respeita-se, coisa que caiu em desuso. Então pegou nos seus sentimentos e tirou-os de si - confessou-os. Disse-lhe tudo e veio-se embora também. Ele ficou com eles, já podia guardá-los ou deitá-los fora. Ela esvaziou-se. E passado pouco tempo, ele já era só uma memória. Já não era tão bonito. Já não era perfeito. Ela diz que a falta de carácter torna as pessoas menos bonitas. Que quando amamos, os olhos adoçam e por isso não temos amigos feios. Por seu turno, quando se revela um interior feio, também a aparência do outro se transforma perante o nosso olhar e a beleza física acaba por se esvair.

Não o odeia, mas ainda lhe custa acreditar no que lhe aconteceu e como tem de atribuir significados a tudo o que a rodeia, diz que talvez ele tenha aparecido simplesmente para lhe provar que estava errada: que quer ter alguém por perto tão livre como ela, para correr por aí sem aquela confortável sensação de que se alimenta quem se afirma como um solitário. Que os sonhos não morreram, talvez os tenha abafado antes por ser mais difícil correr o risco de tentar ser feliz do que acreditar que a felicidade não é para nós.

5 comentários:

  1. É difícil andar para a frente quando não sabemos o motivo pelo qual as coisas não deram certo... Muita força para ti :)

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  2. Nada acontece por um acaso. Acredito que todas as pessoas que entram na nossa vida têm algo para nos ensinar. Nem todos ficam... Custa, machuca... mas o tempo vai-te mostrar que tudo tem uma razão! algo melhor te espera, tenho a certeza! <3

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Obrigada, Joana*

    Não quero melhor, Ana Catarina. Nem pior. Quero não querer, sabes? Obrigada por estares desse lado. Beijinho*

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  5. entendo-te bem demais!!! sempre aqui, já sabes! <3

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Obrigada pelo comentário. :)*