quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

os lares que não são um lar

Margherita Missoni
Desde que me conheço que tenho horror a lares. A sensação que tenho é que os nossos idosos são ali depositados para esperar pela morte. Já não servem para nada e perderam a autonomia, por isso arrumam-se naquele canto para que não incomodem. 
Sei que as coisas não são assim, sei que as famílias nem sempre têm como tomar conta dos seus velhotes, sei que há doenças complicadas associadas ao avançar da idade e sei que muitas vezes eles gostam dos lares que passam a ser a sua casa. 
As minhas duas bffs têm avós em lares e a decisão não foi tomada de ânimo leve porque as famílias não queriam saber deles, mas sim porque não havia uma melhor alternativa. Ambos estão bem e uma delas até se diverte com as peripécias que acontecem sempre que vai visitar o avô. 
Aquela a quem me refiro sempre como e sobre quem já escrevi algumas vezes por aqui, morreu com 110 anos. Na verdade, é minha bisavó. Nunca esteve num lar, mas foi preciso montar uma verdadeira enfermaria no quarto dela para que continuasse a viver em casa com alguma qualidade.
A minha outra avó de que vos falei neste post vai ter que ir para um lar. E eu não consigo conter as lágrimas quando penso nisso. É que apesar da degradação a que vou assistindo sem poder fazer grande coisa, ela continua a ser a avó que fazia tricot, que pintava telas lindas, que me fez a Hanna, uma boneca que ainda hoje está em cima da cómoda do meu quarto. Ela coçava-me as costas e dava-me colo, fazia maionese caseira e namorava com o meu avô. Eles levaram-me ao Aquário Vasco da Gama pela primeira vez. E agora, ela está tão velhinha, tão incapaz de viver sozinha, que vai ter que deixar a sua casa. Cria problemas, não abre a porta às senhoras que vão tomar conta dela durante o dia, não colabora, recusa-se a ser ajudada nas tarefas mais simples como tomar banho. Parece uma criança, só quer comer tostas e beber Coca-Cola. O seu péssimo temperamento não nos permite ponderar trazê-la para junto de nós, até porque ela rejeita essa possibilidade. O mais surpreendente é que a minha avó não parece repudiar a ideia de ir para um lar.
Como é possível que alguém que lia tanto e que sabia tantas coisas se torne de repente numa pessoa completamente diferente? 
Como é possível que uns partam tão jovens e outros percam qualidade de vida e se arrastem por aqui à espera de partir? E ela já queria ter ido embora antes, que viver sem o meu avô nunca lhe agradou. 

2 comentários:

Vanessa V. disse...

Não sou a maior fã de lares. Sou, sim, daqueles em que os idosos são extremamente bem tratados e têm tudo a que têm direito (há poucos assim, mas ainda há, valha-nos isso!). Agora, detesto aqueles lares em que as condições são mínimas, entramos e é um cheiro a xixi terrível e os velhinhos andam lá a arrastar-se! Ou se proporciona o que eles merecem ou mais vale fechar o lar! Mas isto sou eu!

Filipa disse...

Querida Ana,
Se te consolar, existem lares que são verdadeiros Lares (no sentido de home sweet home) para quem lá está. as condições são excelentes e por vezes, acabam por ter mais amizades, divertimentos e ocupações do que sozinhos nas suas casas a ver TV. São lares que acabam por diversas actividades e ateliers para quem lá está. Neste sentido, até é um alívio para a família saber que estão bem. conheço inclusive um local onde até é permitido que seja levada a mobília do próprio (e tem quartos de casal, para os casais!) para se sentir ainda mais em casa. Tenho a certeza que a tua família vai ter o cuidado de escolher um local assim e, quando não estiveres com ela, sabes que vai estar feliz, ou pelo menos acompanhada e segura.

Um beijinho,
Filipa
www.welc-home.blogspot.pt